22 dezembro 2015

ÁFRICA MINHA



     Hoje não teria sido possível ouvir a tua voz se não conseguisses telefonar.  Contudo era quase o eco de uma voz distante e enrouquecida  perante os horrores dessa guerra. Mal te consegui ouvir. Penoso  o cumprimento do dever em terras que parecem  amaldiçoadas: Warwara, Mangari e Bura-Shika.
     É uma África em convulsão atacada nas entranhas, violentada a cada hora que passa. As notícias sobre o ataque foram lentas a aparecer, há dificuldades de comunicação, resultantes da destruição dos postes de telecomunicações feitas pelo Boko Haram em ataques anteriores. Gente malvada e sem coração – disseste-me tu num soluço. Oiço-te e fico-me  presa a silêncio aterrador apenas quebrado pelo respingo da rede telefónica.
     Como é possível que desde há meses  o Boko Haram  venha multiplicando os atentados suicidas, para os quais recorre com frequência a crianças e adolescentes na Nigéria e nos países vizinhos. E ninguém faz nada! Que Mundo estranho este,  e nós aqui  só falamos da Europa e dos EUA. África continua esquecida.    
     Receio pela tua segurança.
     E eu nada posso fazer para suavizar esse sofrimento, essa impotência que te faz submergir, essa raiva que te invade nas noites que parecem não ter fim e que sufocam. Onde está a nossa África? A nossa África Minha das estepes a perder de vista, dos embondeiros que  se oferecem generosos nas suas copas rendilhadas para refrescar a tua e a minha sombra? Lembras-te?
     Saberás tu ainda das noites de céu vermelho e do rugir distante das feras, dos tambores atroando magias?         
     Aquele era ainda  um tempo de paz. A nossa paz. Um tempo em que os nossos corpos eram duas  fontes cristalinas.
     E agora, tu aí, em redoma de ar condicionado; prisioneiro, pois que te está condicionada a liberdade de circulação, guardado  a sete chaves. Olhar perdido, enovelado em pensamentos que se escapam céleres, oxalá  viajem para bem perto de mim, da nossa baía – agora tão mansa e parada de tão triste que está.
 –Espero por ti – confidenciou-me ela neste fim de semana que passou.
     Estive lábem junto às águas mágicas, entretive-me a desenhar círculos na areia molhada –  numa espécie de código.  A distância pode separar-nos  fisicamente mas o meu  pensamento sabe encontrar o  teu, todas as noites, dentro do círculo que desenhei. Porque todas as noites abro as minhas asas e enceto nova viagem atravessando terra e mar. Nem  mesmo que a vaga maior , a da sétima onda,  desfaça  o traço infantil com que quero assinalar como és importante para mim. Volta depressa.
     Na Noite de Natal  junta-te a mim para que o nosso  olhar se eleve  no  profundo do azul ceilão e  oremos ao Salvador para  Ele que tenha misericórdia dos inocentes que sofrem .