26 novembro 2011

O Sistema de Manchester

Está sol lá fora.
Há coisas que me irritam, pois há; mas está sol lá fora!
Sou livre de sair, apanhar esse sol na minha mão, fechar os olhos e sentir que tenho todo o meu corpo a funcionar na perfeição – dou graças a Deus! Sou cristã, acredito que “lá fora” é a catedral onde o Deus em que tenho fé  se manifesta. Apesar de ser inverno, está sol “lá fora”!
Irritei-me e fiquei entristecida  porque na entrada do “meu” prédio - que não é meu, é do senhorio -que  tem  3 apartamentos por piso,  a multiplicar por 7 andares – havia uma cameleira carregadinha com muito mais que 20 botões de camélias vermelhas prontas a desabrochar, as flores eram dobradas; e digo havia, porque já não há! Mão humana e selvagem tratou de cortar as pernadas da árvore, inclusive arrancá-la da terra. Agora o canteiro está mais bonito! E eu adoro camélias, eu e a Margarida . Mas essa morreu tuberculosa - aposto que quem vandalizou a cameleira na entrada do “meu” prédio também terá alguma doença, será demência certamente – e porque anda tudo a ficar doido! E a Tuberculose grassa por aí. E tanto anda tudo a ficar doido que já nem se preocupam em relativizar – não há triagem como aquela nos hospitais – a de Manchester: é claro que quanto mais grave a situação clínica mais rapidamente devem ser atendidos. Ora isto deveria ser aplicado em todos as situações da nossa vida. Perguntam-me onde quero chegar ?! Já lá vou! A situação é a triagem! O que é verdadeiramente importante na nossa vida? Valerá a pena irritar-mo-nos porque a campainha da porta avariou? Ou a torneira? Pinga? Não toca? – a campainha? Bom…. Alguém me dizia que a “cozinha é o coração da casa” – quando existe uma avaria, o pinga-pinga da torneira, o esquentador que não funciona, o fogão que tem os bicos entupidos! Faz favor de ir à triagem!!! Fita verde colocaria eu no pulso dessa pessoa – não é emergente, não é urgente – é “chato” ah , pois é! O coração da casa somos nós, aliás nós somos o coração do mundo! Mas querem saber o que verdadeiramente é mais chato? É não poder ir “lá fora” pelo próprio pé, sentir o sol na cara, e ainda estar “lá fora” e não poder “ir para dentro” simplesmente porque o “ir para dentro” não existe – traduzindo : sem –abrigo, sem emprego, sem serviço nacional de saúde, sem médico de família e , pelo andar da carruagem, sem salário! Isto pela triagem de Manchester é uma fita vermelha no pulso, um AVC ! E como hoje é sábado e o sol brilha lá fora, vou sair e dar valor às pequenas coisas, que são muito maiores do que nós julgamos – e até que sabemos disso, mas temos tendência a esquecer – de vez em quando levamos um abanão , quando vemos um familiar ou amigo a partir , sabe-se lá para onde – e por breves instantes temos a noção da dimensão das “coisas” . Ora minha gente, vamos lá a relativizar e a dar sentido à vida! Apliquem nas vossas curtas existências o Sistema de Manchester! Pena foi a cameleira que foi á vida! Vandalismo puro!!! É com isto que temos de viver!

24 novembro 2011

O Grito




O Grito (no original Skrik) é uma pintura do norueguês Edvard Munch, datada de 1893. A obra representa uma figura andrógina num momento de profunda angústia e desespero existencial. O pano de fundo é a doca de Oslofjord (em Oslo) ao pôr-do-Sol. O Grito é considerado como uma das obras mais importantes do movimento expressionista e adquiriu um estatuto de ícone cultural, a par da Mona Lisa de Leonardo da Vinci.

E porque o silêncio também pode ser violência
Quando nos obrigam a calar
Quando não querem ouvir mais nada
Em que se  conjugue o verbo Amar.
E agora silenciada, que é como gostam
E  a reprimir o que sinto
Que mais quereis de mim ó gentes
Apenas que vos diga porque minto?
Não posso, estou amordaçada
Na boca e no coração
Fui proibida de  sentir, proibida de tocar
Resta-me não sei o quê atoarda e palavrão
É assim que me quereis ? Endurecida e cruel?
Em vez de usar caneta,  marco com estilete o papel?
Confesso que estou tentada, talvez a usar o dito
Em vez de rasgar a folha, libertar-me desse modo
De quem me obriga a calar e rasgar o maldito
Abrir-lhe um sulco profundo, e tingido de vermelho
Morra  a vociferar, aquele que me silenciou
E não me deixa ser grito.!

19 novembro 2011

O espelho

Óleo sobre tela de Lord Frederick Leighton - Light of harém (1830-1896)
Não preciso mais de espelhos
Para ver o que não está lá
A duplicidade é enganosa
Trai-nos com a realidade
Reflectida e ruinosa
O espelho do poeta
É a alma onde se miram profundezas
É lá que se busca a coragem
E se quebram as tristezas.
Assim para quê o espelho
Se a imagem não é fiel?
Há que cortar as amarras
Que nos poluem o espírito
Como se fossem fel,
amarguras não as tenho,
antes dúvidas, e mesmo assim,
quando olho no meu espelho,
não vejo nada de mim.
E se visse não olhava
com olhos de querer ver
para que o espelho não me engane
e não me faça sofrer.

14 novembro 2011

Convite

Miguel Almeida, coordenador desta colectânea, lançou-me o repto que, com gosto aceitei: Poesia divulgada aqui neste blogue, e agora publicada pela Editora Esfera do Caos. Eis o resultado : … uma agradável surpresa… … uma obra para todos os que vivem e sentem a poesia com intensidade… da qual me orgulho de fazer parte convidando a estarem presentes no dia 3 de Dezembro, pelas 17 horas, na FNAC do Colombo.

07 novembro 2011

O som dos meus passos


A minha alma esfarela-se na penumbra
Aqui nesta soleira da porta onde estou sentada
À espera, eternamente olhando o mar
Sempre com a esperança de te ver chegar.
Mas nem nos ventos, que o mar sopra, tu vens.
E neste desespero a  morder esperança
Cerro os dentes, firmo-me e digo
Não sonhes ó louca, não sonhes
Já não és criança!
 Mas olha, lá mais no fundo, na linha escura
Onde o mar acaba e o céu começa
Há uma estranha claridade, deixa que a vida se transforme
Deixa. Dá-lhe um par de asas e devolve-a à liberdade
Tens a vida presa por um fio, como se fosse balão colorido
Solta-o, deixa-o ir devagar no céu subindo
A ver a campina, a serra, o rio  e tu meu amor lá em baixo
A florir palavras mágicas, tacteando com as tuas mãos
Que eu finjo que me dizem adeus aí em baixo
E solto nas voz matinal dos pássaros
O eco do som dos meus passos.

04 novembro 2011

Morte e Vida


A morte torna-se tão certa
Quanto a vida o é
Pois é nascendo que se morre
E tudo mais é uma questão de Fé.
Pois assim sendo, como viver
Se vivendo é morrer
E tudo o mais nem sequer é.
A real(idade) é real (in)conforme a idade
Quanto mais longe da vida
Mais amar(rada) a liberdade
Menos te resta a ti ó escravo
Para com Fé morreres em Verdade.
Não ouses pensar que és livre
Verdadeira utopia
Nasces, vives e morres
Por um  passe de magia
Nem tu nem eu saberemos
Distinguir, qual a noite, qual o dia
Em que és impelido a viver
O inicio de  morte escorregando a vida
Como que por almotolia
talvez para dar lugar
a um novo (re)nascer.