30 janeiro 2012

Beira rio


Tudo tão azul,
Este rio, este mar,
Que já não sei se é céu
O que alcanço com o olhar.

Pasmo emudecida
Em contemplação pela vida
E detenho-me com espanto
Ao reparar na imensidão
Que sem ter fim ou principio
Compreende este bailar
Das aves que riscam o céu
dos barcos a navegar
E neste meu devaneio
Acompanho com o olhar
Até onde a vista alcança
lá longe a curva da ponte 
onde nasce a esperança.


24 janeiro 2012

VERTIGEM


Autor desconhecido - Foto retirada da net
A vertigem que sinto 
quando em ti pousa o meu olhar
E sonho imaginando,
Ou  imaginando sonhar
Que te possuo e como se fosses  de veludo
Envolvendo-me a alma  e em  tudo
sinto esta estranha sinestesia
Esta vibração que me deixa endoidecida
Quando as tuas mãos nas minhas
E os dedos oscilando com mestria
Me fazem tremer este insólito sentir
Que sobe ao cume mais alto
Desígnio de um obscuro provir
Que do mais profundo de mim brota
E mais e mais me faz fluir.
Abandono-me assim à fantasia
De te imaginar sonhando
Enfeitiçando-me o prazer
De na minha boca ter o gosto
Deste gozo que por tanto subir
Cai abrupto e falido
Exangue e elanguescido
Adormecendo-me amante
Desenhando-me no rosto
Um quebranto a sorrir

Pablo Alborán - Desencuentro


No puedo seguir
buscando tu aroma en el viento
no puedo mentir
y ocultar lo que siento

Intento vivir sufriendo bajo este silencio y de nuevo por ti
me hundo en un infierno
no era prisionero de tus
labios y ahora que estas lejos yo te deseo como el aire
del baile de tu cuerpo

Puedes olvidar mi nombre
puedes olvidar mis besos
pero en el aire permanece
mi voz y mi recuerdo.

Sufriendo por ti me pierdo en un mar de dudas
me mata este dolor, me ahoga mis lagrimas
en dudas mi mar es cada noche mi cuerpo y mi alba haces
lloras mis ojos haces que pierda la calma

No era prisionero de tus labios y ahora que estás lejos
Te deseo como el aire del baile de tu cuerpo
no era prisionero de tus labios y ahora que estas lejos
Yo te deseo como el aire del baile de tu cuerpo

Puedes olvidar mi nombre
Puedes olvidar mis besos
Pero en el aire permanece
mi voz y mi recuerdo

17 janeiro 2012

Um Novo Começo


Nú Feminino - Manoel Constantino 
 
Ninguém pode fazer história se não quiser arriscar a própria pele, levando até o fim a experiência da própria vida, e deixar bem claro que sua vida não é uma continuação do passado, mas um novo começo. Continuar é uma tarefa que até os animais são capazes de fazer, mas começar, inovar, é única prerrogativa do homem que o coloca acima dos animais.
Com efeito ela assim pensava e lutava para se manter à tona da dura realidade que enfrentava há já alguns anos.

Vitima de violência doméstica com requintes de tortura psicológica tinham-na levado ao seu limite máximo de resistência. Ele tinha sido militar e fez questão de aplicar nela as  práticas destinadas ao inimigo: agredia sem deixar marcas físicas.

Um dia ela fugiu.

Fugiu dele e de si própria. Deixou de o amar e pensava muitas vezes que, provavelmente nunca o teria amado – saiu de uma relação de tantos anos a pensar que não tinha sobrado nada. Esqueceu tudo o que ficou para trás.
Recomeçou.

Procurou refugio e companhia e deixou-se novamente encantar, pensando que com isso se libertaria realmente. Entregou-se , de novo, de corpo e alma. Havia  uma rosa a florir e um responsável por esse florescimento. Tinha levado tanto tempo aquele jogo de sedução.
De novo o destino lhe bateu no corpo e na alma. Recusou-se a acreditar que fosse possível tal sorte. Lembrava Jung e concordava com ele: (...) O homem que não atravessa o inferno de suas paixões, também não as supera”.
Revestiu-se de paciência, procurou refúgio em Deus, tentou perceber o que era o Amor e percebeu que finalmente amava, contra tudo e contra todos.
Sucede que  “O homem sobrevive a terremotos, epidemias, aos horrores das doenças e a todas as torturas da alma, mas a tragédia mais atormentadora de todos os tempos tem sido, é e será a tragédia da cama”. Leon Tolstói

Ela não compreendia porque é que ele fugia dela, não percebia se a ausência de desejo dele era somente por ela ou se seria por todas as mulheres em geral. Tentou perceber o pensamento e o sentir masculinos. Em vão. Sofria horrores por não conseguir sair da situação. Tornou-se obsessiva, dava tudo de si e recebia tão pouco.
Deu por ela a envelhecer antes do tempo. Deu por ela a viver a vida que era dele em que nunca conseguiu desenvolver as suas potencialidades e afectos, A tentar ser perfeita, demonstrando que tudo estava bem quando afinal não estava: os seus olhos tinham perdido o brilho, à libido tinha-a amordaçado, deixou de cuidar de si e do seu corpo, a cada dia que passava deixava de ser feminina.
Se as pessoas tivessem enchido antes a taça da vida até transbordar, e a tivessem esvaziado até a última gota, certamente seus sentimentos agora seriam outros. Tudo aquilo a que quereria  pegar fogo estava consumido, e apesar da quietude da velhice ser bem vinda para muitos, ela no seu íntimo revoltava-se porque não conseguia esquecer que só poucas pessoas são artistas da vida, e que a arte de viver é a mais sublime e a mais rara das artes.”
Ele tinha-a renegado.
Para além disso doía-lhe os olhares dele para  outras mulheres- as da faixa etária dos 30. Não compreendia, decididamente a psique masculina. Não era só ele que sofria, ela também –e calada.
Ultimamente andava  numa fase de indecisão: envelhecer calmamente ou voltar a ser quem era, cuidar de si e do seu corpo e partir de novo para a vida. Um novo começo que significava desligar-se dele e tentar esquecer o que significava amar.



14 janeiro 2012

Asas de Linho



 Dédalo e Ícaro

" Quando será derrubada a infinita servidão da mulher, quando ela viverá para ela e por ela, o homem, - até agora abominável -, tendo-a despedida, ela será poeta, ela também!
A mulher descobrirá o desconhecido! Seus mundos de ideias divergirão dos nossos? Ela encontrará coisas estranhas, insondáveis, repugnantes, deliciosas; nós as teremos, nós as entenderemos." Arthur Rimbaud


Um dia virá em que voarei
Com  asas de alvo linho
Que me entretenho a fiar.
Não as asas de cera,
As  de  Dedalo  tombado no mar
O  fito é fugir daqui
Deste labirinto onde existe
um monstro que me quer aniquilar,
Cabeça de touro, corpo disforme
Alma inexistente ou se a tem
Parece  não a quer revelar
Farei um castelo da nuvem mais alta
Por sol terei uma estrela
E lençóis de gaze para me tapar
E lá do alto vigiarei o sono
Dos que  não perderam a esperança
E lutam para a  realizar.


03 janeiro 2012

Tempestades



Farol da Guia. 1900.
Aguarela s/ papel. 35,5 x 39,2 cm.
Colecção particular.
Foto: Pedro Aboim Borges
A minha vida é um rio
Sempre a correr para o mar
Ecos da minha génese
Que não consigo parar.

Percorro montes e vales
Sempre a serpentear
Roubo das latadas
Cachos de uvas, jasmins
E flores de absinto.
E deixo-me embriagar
Malvasia, moscatel
Em  cálices de puro âmbar
Em leitos feitos de mel.

E vou deambulando
Até à foz deste meu rio
Onde a vida me quer levar
Espraio a minha alma  azul
Com fímbria branca a debruar
Por entre a espuma das ondas
Que te querem abraçar
E neste suave balanço
Num vai e vem sem ter fim
De sete em sete ondas
Avassala-me a saudade
Que sinto dentro de mim
Então surge a tempestade
E o mar rola furibundo
Sempre à procura de ti
Galga terra e galga pedra
Vai ao cimo e vai abaixo
Vai até ao fim do mundo
Sem nunca te encontrar
Onde foi que te perdi
Porque me deixaste afogar?