Entre tantas memórias de infância que polvilham a minha mente, lembro-me da casa da avó Ermelinda, que ficava no bairro das Colónias, um primeiro andar cheio de tios, tias e primos que entravam e saiam em risadas e agitação constante.
Nos dias festivos cheirava a arroz doce ,canela e filhós que inundavam a mesa, e por baixo da qual costumávamos brincar , lugar quase secreto, rodeado do que para nós era semelhante a um enorme dossel, que nos protegia do olhar inquisidor dos adultos.
Enormes janelas, quase do tamanho do pé direito da casa, tinham cortinas de voile transparente que espelhavam a luz do dia ou a dos candeeiros de iluminação pública. E as cortinas dançavam. E eu dançava enrolada nelas, sob pena de as fazer cair. Parava apenas quando ouvia um solene ralhete - porque os varões dos cortinados poderiam cair - o que me fazia esquecer de imediato que era uma princesa vestida de brancas vestes , com toques de lua ou de sol no meu vestido cor de nuvem.
À noite, afundados nos lençóis brancos e frescos , ouvíamos na sala contígua as conversas dos adultos, que se iam diluindo e tornando longínquas à medida que o sono tomava conta de nós.
A avó Ermelinda era a matriarca da família. Conservo ainda hoje a imagem da sua ternura, e do espirito gregário sempre presente em torno dos seus 12 filhos, já todos falecidos.
Um dia prometi à avó plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho...
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