16 abril 2011

So tonight that might see


Tem noites em que se morre depressa, muito mais do que nos dias em que se espera pela morte e ela vem devagar.
De dia custa mais a morrer porque existe o sol a brilhar, mas nessas noites onde se morre rápido, noites onde o abraço desejado tarda em chegar, onde a cama se transforma num palco que nos aprisiona, ah sim nessas noites morre-se conforme avança a roda do tempo. Nessas noites ama-se mais a morte do que a própria vida, e porque a morte já nos levou pedaços de nós.
Quando a tua boca é um poço sem fundo, onde não germina o fogo, onde não se vê o brilho das estrelas, morre-se depressa olhando os teus olhos deitados na treva que nos cobre a ambos. E o sono não desce, não me mata este acordar que tem por companhia o pêndulo que oscila entre o dia e a noite.
Algures surge da treva o leve esvoaçar da cortina branca, como se fossem asas brancas que me chamam e a quem eu digo para esperarem, talvez a morte não me leve ainda por inteiro e me deixe um sopro de vida. O necessário para voltar a renascer com o amanhecer. Resta possivelmente o suspiro interior. A espera pausada a saber que dou por mim devagar nesta morte da vida. Afinal amo aquilo que não tenho, será isto a que chamam amar?
E porque não desceu a tua mão sobre as colinas ensombradas, porque não passou como ave no vale  escuro, na gruta onde brotava água que nos mataria a sede?
E o teu rosto , que me diz o teu rosto a não ser o mote para seres parte de poema, explosão de um acto solitário, talvez a poesia seja a masturbação do espírito, talvez procure na treva o motivo que me leve a ter prazer desta forma, morrendo-me eu amiúde sempre que te desejo e invento o desejo a sós, olhando as asas brancas a ondularem sobre mim, um convite mudo, o chamamento. Sempre a lembrar que acabei de morrer no passado do verbo. Morri ontem, morri hoje, morro aqui. Tem noites em que se morre depressa, muito mais nos dias em que se espera pela morte e ela vem devagar.

1 comentário:

Jorge Pimenta disse...

a cada verso desprende-se da mão uma centelha de vida. e a morte embala na verdade do poema.
um abraço!