07 abril 2008

Colo de Garça (III)

O sorriso tinha tomado conta de mim e de todos os que me rodeavam. Eu era o pronúncio de alegria, casa cheia e simbolo de união, tocando aquelas dois seres que já tanto haviam sofrido.
Agosto decorria quente, mesmo ao entardecer, ao toque das trindades, ouviam-se em contra-ponto as andorinhas, que em despique com o badalar do sino da torre da igreja chilreavam em bandos, fazendo voos rasantes quase junto do meu pequenino berço. E eu segui-as atentamente, adormecendo em seguida.
Já noite instalada, algo de estranho começou a tomar forma no céu.
Um forte cheiro a queimado inundava o ar, estavamos no dia 13 de Agosto de 1959 e
no Rossio, terreno empapado de sangue e sofrimento, em pedras marcadas para sempre pelo terror da Inquisição, os gritos que ainda hoje ecoam, dizem para quem os consegue ouvir, vinham reclamar o eterno descanso sobre a forma de fogo na Igreja de S. Domingos.
E porque o fogo tudo queima, tudo consome, tudo purifica...
Mesmo ali ao lado, a Praça da Figueira, a figueira que já não existia, que Dom Pedro tinha mandado cortar, em momento de ira e de dor pela perda do seu "Colo de garça".
Mesmo ali ao lado, surgiam bandos de populares, em passos apressados com o terror espelhado no rosto e na alma...
Bandos de almas perdidas....

1 comentário:

O Profeta disse...

Fantástica resenha histórica sobre a cidade de Lisboa, são blogues como o teu que vale a pena visitar...


Doce beijo