Tardes lisboetas na zona da Baixa são um pouco o espelho da Nação. Largo de S.Domingos pejado de estudantes caloiros em praxes sem sentido, embriagados em sonhos e copos de ginginha, à mistura com emigrantes oriundos das sete partidas do mundo. Estes últimos transaccionam de tudo um pouco, (passaportes, diamantes, telemóveis e cartões furtados,) ao incauto que por ai se movimenta. O sol vai bafejando estas gentes, tornando-lhes a vida menos penosa, não obstante a dívida externa que diariamente aumenta, em cerca de 100 euros por cada português aqui nascido e criado.
Chega-me os sons da rua das Portas de Santo Antão, um grupo de quatro cabo-verdianos toca e encanta os passantes com mornas que adoçam a pedra da calçada à portuguesa; desta feita o mais jovem, filho de um dos elementos do grupo, uns 4 anos de existência, marca o ritmo e ginga ao som do batuque. Não deixo de sentir ternura e sorrio ao ver ao a sua espontaneidade de criança, num mundo de adultos sem nexo aparente. No entrada de certa instituição das redondezas, sentados nos degraus de pedra , em amena cavaqueira decorre a conversa entre vários elementos: um "segurança", o vendedor de castanhas e gelados, (embora no mês de Setembro intercale com férias, fruto da mudança de estação, não demorará a chegada de Outubro e o cheiro da dita castanha assada), juntam-se-lhe o motorista do edifício ao lado, o construtor civil e o empregado de mesa que saiu às quatro da tarde – falam de futebol e da politiquice rafeira.
Alguns turistas imobilizam-se em frente ao estabelecimento da ginginha das Portas de Santo Antão, num círculo alargado, copo de plástico na mão, assistem atentos ao concerto improvisado distingue-se o som de “Angoláaaaa.... angoláaa”. Melodias plenas de nostalgia, alguns, parcos euros caiem nas caixas das violas, onde uma t-shirt aberta com os dizeres “Cabo Verde” convida a deixar o contributo.
As esplanadas estão cheias de gente ociosa, desfrutando não sei que belezas arquitectónicas citadinas, porque esta mesma cidade continua decrépita e suja.
Deambulando pelo Largo de S. Domingos, cruzamo-nos com gentes ligadas ao debate público, uma espécie de “Corredor do Poder” popular, de microfone na mão com a finalidade de convidar a população a participar e a dizer de sua justiça apresentando ideias e sugestões para melhorar a vida política do País; há mendigos dormindo placidamente um sono que seria de justos, não fosse as injustiças da vida, obrigando a que qualquer pedaço de chão sirva de leito.
E existem os pombos às centenas, sobrevoando tudo e todos em busca de cada migalha milimétrica, fazendo uma guerra silenciosa com os pardais da cidade.
Dia após dia a cidade vai sobrevivendo, um marulhar imenso de gentes que entra e sai para trabalhar. A Praça D.Pedro IV , por volta das sete da noite começa a ficar vazia e à noite as ruas da Baixa tornam-se isoladas e perigosas, abrigo de marginais, toxicodependentes e sem-abrigo que todos os dias aumentam por aqui.Também deste lado do Rossio um grupo de músicos da América-Latina costuma animar as tardes, em frente à entrada da estação do Metropolitano, findando a tarde, fazem as malas e carregam a carrinha para outras paragens. São estes alguns dos muitos retratos de Lisboa.
2 comentários:
Retratos de Lisboa muito bem tirados. Pela qualidade da fotógrafa não seria de esperar outra coisa.
Agradeço o seu comentário no meu blogue e espero que haja muitos mais portugueses com suficiente dignidade para evitarmos a eleição (embora pouco provável)dum covarde oportunista.
Um abraço com uma certa saudade.
Não passei por lá nesse dia das "festas académicas", mas passei dois ou três dias depois e o espectáculo não andava longe do descrito. Tirando a má qualidade da ginjinha que já vem de longe (como dantes vinha a do brandy Constantino) o único motivo de interesse é ver como a zona se transformou numa espécie de O'NU
vestida de muitas roupagens.
Mas, mesmo assim, um dia destes volto lá...
Petrarca
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